Crise e superação dos governos progressistas na relação mundial de forças atuais


Crise e superação dos governos progressistas na relação mundial de forças atuais

Dentre os melhores ensinamentos revolucionários da história podemos citar a previsão do Partido Bolchevique de prever que viria a primeira guerra mundial. Momento de fragilidade das burguesias mundiais, e portanto, momento de se fazer a revolução russa. Esta capacidade de previsão dentre outros fatores como a organização do partido bolchevique e o poder dos sovietes foi determinante para o sucesso da revolução russa.

A primeira década do século XXI para a América Latina foi marcada pela acensão de movimentos populares, governos reformistas-progressistas chamados de esquerda que retomando parte das rédeas da economia estatal puderam desenvolver importantes políticas de inclusão social. Aproveitando a situação econômica mundial favorável puderam manter índices consistentes de crescimento econômico com inclusão social.

Passado este período, entramos numa maré de golpes de direita de toda espécie contra estes governos, crise econômica mundial e baixíssimo crescimento econômico local, revertendo substancialmente as conquistas anteriores para os povos.

Quais as causas que levaram a esta situação? Em primeiro lugar, a falta de funcionamento político de partidos de esquerda para prever o processo. Mesmo com todo o patrimônio político e social adquirido durante o período de ouro, não foram previstos fatores desestabilizadores econômicos e políticos internos e externos. Sem previsões,  ficou-se “surfando” nesta maré por muito tempo contando com a não reação das forças neoliberais. A estrutura burguesa parlamentar estruturou um poder sem grandes enfrentamentos pois “tudo corria a mil maravilhas”. Não se previu a necessidade de se utilizar destas estruturas de forma tática e acumulativa de forças para reformas que minimamente tocassem nas estruturas de poder e ao mesmo tempo, fortalecesse os movimentos independentes, sindicais e populares.

A ilusão, sem transformações profundas levou à paralisia frente à crise econômica com brutal queda nos preços das comodisties, minerais, recessão econômica tendo como centro a crise financeira em 2008, impondo péssimas condições às economias latino-americanas. Diante deste quadro, a direita que já vinha se preparando para golpear intensificou suas ações de forma semelhante em vários países mesmo com especificidades para um ou outro país. Usando a bandeira do combate à corrupção desencadearam o ataque midiático de desmoralização de qualquer liderança popular. Judicialização de líderes populares e em alguns casos, levando-os à prisão. Revoluções de veludo surgiram com manifestações manipuladas pela mídia do poder hegemônico.

Outro ponto que é preciso precisar diz respeito a de identificar a tempo os inimigos dos trabalhadores e dos setores excluídos da sociedade. Para defender a Revolução de 30, em 1932 Vargas pegou em armas para derrotar a contrarrevolução constitucionalista que naquele momento tinha o apoio do imperialismo inglês. Podemos dizer que a Presidenta Dilma deveria a exemplo de Vargas tomar em armas para defender um governo popular e democrático? Ou chamar a uma insurreição popular para se contrapor ao golpe parlamentar?

Para se chegar ao ponto de tomar uma decisão e chamar uma unidade cívico-militar para defender-se contra o golpe seria necessário um trabalho prévio de politização das Forças Armadas em defesa da soberania nacional. Trabalho que o PT e os partidos de esquerda sempre tiveram dificuldade de fazer ou praticamente não fizeram. O raciocínio pode parecer simplório: ou a esquerda chama as Forças Armadas para defender a soberania nacional ou a direita as convoca para defender o golpe de direita. Não existe um pensamento monolítico dentro da Forças Armadas. Como qualquer corpo social, as Forças Armadas precisam ser disputadas. E Getúlio Vargas em 1932 só pôde resistir porque tinha as Forças Armadas do seu lado, do lado de um programa nacionalista, desenvolvimentista e que depois tomou outros rumos com o golpe de 1964.

Mas o problema não se resume somente na capacidade de o indivíduo ser protagonista na história. Lógico que os indivíduos têm um papel importante na história. Como tem sido citado ao longo da histórica, personalidades como Getúlio Vargas, JK, Jango, Brizola, Tancredo, Itamar, o próprio Lula ganharam e perderam batalhas para não dizer que perderam a “guerra” como foi o  golpe de 64. Para se ter uma estratégia de vitória é preciso conhecer melhor o inimigo. Qualificar melhor como se organiza o poder mundial num mundo cada vez mais globalizado, onde se leia, cada vez mais com poder de concentração financeira e portanto, concentração de poder político, militar e midiático.

O General Leonid Ivashov, durante Conferência  Axis For Peace, Bruxelas, em 2005 – importante registrar que os russos já se davam conta desta situação mundial desde aquela época-, referindo-se al terrorismo assim qualificava a situação mundial: “a análise da essência do processo de globalização, e das doutrinas políticas e militares de Estados Unidos e de certos países, prova que o terrorismo contribuiu para concretizar um domínio mundial e a submissão dos Estados a uma oligarquia global. Isso significa que o terrorismo não é um ente independente da política mundial senão simplesmente um instrumento , um meio para instaurar um mundo unipolar com um centro único de direção mundial, um pretexto para acabar com as fronteiras nacionais dos Estados e instaurar o domínio de uma nova elite mundial”.

A questão que se coloca para todos os governos progressistas latino-americanos para não dizer do mundo é saber qualificar bem o seu inimigo e como se contrapor as suas ofensivas. Não se trata mais de lutar contra a oligarquia cafeeira paulista mas estamos falando de um mundo controlado e dominado pelo capital financeiro improdutivo. O que significa isto? Estamos sob o domínio de uma oligarquia financeira mundial que se utiliza de todos os avanços tecnológicos para se beneficiar, não mais no campo da produção de bens, mas fazer dobrar suas fortunas apenas com aplicações financeiras, totalmente desvinculadas do mundo real.

Isto tem um preço altíssimo para a humanidade. Um Bilhão de pessoas passam fome. Milhares vivem erráticos pelo mundo como nômades. Degradação ambiental. Crises econômicas. Para termos uma dimensão numérica desta tragédia humana basta constatarmos alguns números. O PIB mundial é calculado em 80 trilhões de dólares. Só nos paraísos fiscais, calcula-se um valor de 20 trilhões de dólares, recursos não declarados que não pagam impostos. Desde 2015, o 1% mais rico do mundo detinha mais riquezas que o resto do planeta. Atualmente, oito indivíduos detêm a mesma riqueza que a metade mais podre do mundo. Ao longo dos próximos 20 anos, 500 pessoas passarão mais de 2,1 trilhões de dólares para seus herdeiros – uma soma mais alta que o pIB da India, que tem 1,2 bilhão de habitantes.  A concentração de renda e de riqueza no planeta atingiu níveis absolutamente obscenos. A financeirização dos processos econômicos há décadas se alimenta da apropriação dos ganhos de produtividade, essencialmente possibilitados pela revolução tecnológica, de forma particularmente desequilibrada.

Então estamos fadados ao domínio do capital financeiro improdutivo? Há algum exemplo que tenha saído desta armadilha?  Podemos citar os exemplos da Rússia e da China. No caso da Rússia e da China, prevendo a crise provocada pelo desajuste financeiro mundial, criaram um sistema de comércio e câmbio autônomo. Hoje transacionam trilhões de rublo e yuan no seu comércio sem utilizar o dólar. Com uma característica de estabelecerem lastro de suas moedas ao ouro, ou seja, não estão emitindo moeda sem lastro como vem fazendo os EUA há anos.  Modalidade que se estende mundo afora.

Mais uma vez faz-se necessário prever o processo futuro. Há 14 anos os russos previram que diante de sua política de se contrapor a Otan e ao imperialismo era necessário criar estruturas autônomas para enfrentar o imperialismo norte americano. Anteviram esta situação em decorrência das suas relações comerciais com a China, o apoio ao governo nacionalista da Síria e ao governo revolucionário do Irã, para não falar da sua decisão de não abrirem mão da Criméia. Outro fator para resgatar um polo contra o imperialismo norte americano é a unificação China Rússia tornando-se realidade.

Voltando à questão da América Latina e do Brasil foi importante a criação de polos que para possibilitar uma autonomia na região, como a Unasur e a Celac. Mas não foram suficientes para se contrapor ao poder imperial financeiro e midiático. Como teve importância, de certa forma, a participação nos BRICS.  Mas os processos sofreram ataques políticos e financeiros que possibilitaram grandes retrocessos nos governos progressistas, antes que promovessem um salto a estruturas de Estados revolucionários.

No caso do Brasil, o estado está sequestrado pelo capital financeiro. Do orçamento da União aprovado pelo Congresso Nacional para 2018, 1 trilhão e 285 bilhões de reais serão destinados ao pagamento dos juros e encargos da dívida pública. Isto significa 37% de todo o orçamento da União. Some-se as desonerações fiscais, como mais recente em que foram concedidos isenções fiscais de 1 trilhão de reais para a Shell e petroleiras, nos próximos 25 anos. Somem-se as sonegações de impostos. Enquanto o país crescia a taxas zero, os bancos tinham seus lucros aumentados em mais de 20%.

Temos que reconhecer que com todo o patrimônio político iniciado pelo governo Lula, não fomos capazes de prever com que forças estávamos tratando, forças que mais cedo ou mais tarde buscariam golpear, e por isto, não fizemos as reformas necessárias, a reforma política, a reforma tributária, a reforma agrária, a reforma patrimonial. E principalmente, não fomos capazes de criar uma mídia autônoma. A Rússia e a China tem mídia autônoma. A RT TV Russa faz um jornalismo de primeira qualidade.

De qualquer forma, é necessário ficar atentos e sem preconceitos a movimentos que possam reverter a situação atual. É certo que o movimento sindical da CUT não entendeu a Era Vargas mas não foi a falta deste entendimento que possibilitou o golpe contra a Dilma, teve a sua incidência, mas não foi o determinante. Fará falta o imposto sindical mas a fragilidade do movimento sindical de reagir ao golpe remonta à sua relação com os governos Lula e Dilma, quando não souberam crescer, mobilizando de forma crítica, construtiva e independente, como classe. Ao movimento sindical cabe fazer uma análise mais geral da sociedade e do mundo capitalista financeirizado e propor transformações sociais mais profundas.  Deve ter a autonomia de lutar por um programa de transformações sociais, fato que já ocorreu à CUT em tempos de luta contra a ditadura e pelos direitos trabalhistas e sociais da classe trabalhadora.

Quanto às Forças Armadas, é preciso ficar atento a movimentos que não podemos prever mas que precisam ser acompanhados. Até que ponto, as Forças Armadas cumpriram um papel reacionário como cumpriram com o golpe de 64? Ou vão se manifestar contra a entrega da soberania nacional realizada pelo governo Temer? O comandante Eduardo Villas Boas em suas declarações refere-se à falta de um projeto nacional e tomou como exemplo, a Era Vargas de 1930 a 1950. Fez referência às ideias de Aldo Rabelo e Leonardo Boff. Chamou atenção para a nossa passividade em relação à soberania do nosso território, ressaltando que só a Amazônia detém 23 trilhões de dólares em riquezas. Para tanto, propõe a constituição de um Ministério da Amazônia.

Grandes problemas requerem grandes estratégias. Propomos que se faça um chamado à união cívico-militar em defesa da soberania nacional e contra toda entrega do nosso patrimônio que está sendo realizado pelo governo golpista e usurpador de Temer. Pode-se argumentar que agora é tarde para este chamado, mas não resta outra alternativa ao povo, senão fomentar com ideias e mobilizações a formação de uma frente nacionalista junto com a Frente Brasil Popular, os partidos de esquerda, os movimentos sociais. Prevendo que se prenderem o Lula, o morro desce.   Juntar-se à Frente Mista Parlamentar pela Soberania Nacional presidida pelo Senador Roberto Requião e pelo Deputado Federal Patrus Ananias.

Defesa incondicional do companheiro Lula. Defesa pela candidatura do Lula à Presidência da República sem plano B. Em torno da defesa do Lula organizar uma frente única da esquerda, fazer um chamado a unidade cívico militar em defesa da soberania nacional, de partidos de centro, de empresários nacionalista, dos movimentos populares e sociais, de intelectuais, de religiosos, dos cantores e compositores. Se prenderem o Lula, o morro desce mesmo com as Forças Armadas ocupando o Rio de Janeiro.

16 de fevereiro de 2018.
Comitê de Redação

Jornal Revolução Socialista

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