É preciso contextualizar a vitória de Lula e a volta do PT ao governo dentro da profunda crise interna das burguesias nos EUA e na Europa, para prever alianças políticas, mas também ritmos e prazos.
Biden vai buscar conter a influência da unificação da Rússia e China e a possibilidade do crescimento dos BRICS sob o governo Lula. O mundo constata que unir-se com os EUA é o retrocesso. Unir-se com a China, com o BRICS abrem possibilidades de desenvolvimento. Qual a política dos EUA para a Europa? O fomento de uma guerra contra a Rússia, via Ucrânia, vendendo uma energia mais cara – que era fornecida pela Rússia através do Nord Stream a um quinto do preço–; e a desindustrialização da Europa. Nesta conjuntura a economia está determinando a política. Os árabes que tinham pleno alinhamento político com os EUA, deslocam-se para um maior relacionamento com a Rússia, China e Irã, em acordos econômicos estratosféricos. Os EUA já não estão em condições de impedir que navios militares do Irã estacionem no Rio de Janeiro para ir ao canal de Panamá, ou petroleiras iranianas na Venezuela. O Pentágono destruiu o Nord Stream, mas depois não consegue manter a Ucrania feita a pedaços. Blinken (secretário de Estado dos EUA) corre até Israel para impedir qualquer loucura contra o Irã, e a Inglaterra diz que dará os aviões de caça só depois que a guerra terminar.
Há uma turbulência profunda na santa aliança com os EUA contra a Rússia, devido ao prolongar das consequências do apoio à Otan e à guerra e o rebote sobre as economias europeias, e sobretudo, sobre as condições de vida das massas, centralmente pela questão da energia e suas consequências econômicas e sociais. Os governos europeus vacilam, embora tentem mostrar unidade e determinação. Basta ver o que ocorre na França, e recentemente na Espanha: mesmo sem nenhum instrumento de análise sobre a verdadeira natureza da guerra – pois nenhuma direção tem a audácia de assumir abertamente que trata-se da resposta russa ao crescimento do nazismo e ao cerco imperialista –, as massas não apoiam seus governos, e exigem a manutenção das conquistas e dos direitos e rechaçam as medidas de aperto e restrições que são exigidos justamente em nome da “solidariedade” europeia com os ucranianos.
O fato é que o sacrifício dos povos da Europa é inaudito. É incrível que tenham restrições deste montante, tipo ficar no frio dentro das próprias casas, pois é proibido ligar o aquecimento por mais de algumas horas, ou pagar contas absurdas de luz, gás, combustível. Até agora a propaganda de guerra conseguiu neutralizar parte dos protestos, mas esta frente pode se romper. Os russos parecem determinados a não ficar no pântano em que se meteram, vacilaram, acharam que iriam até certo ponto e que os ucranianos iriam ceder e negociar as novas fronteiras. Nada disso, o imperialismo ainda os estimula a negociar “só se os russos se retirarem”, ou seja, nunca. Então, os russos sentem que não podem continuar num impasse, sofrendo bombardeios e ataques de mísseis mesmo nas zonas libertadas do fascismo, enquanto que o ocidente arma os ucranianos até os dentes, e ameaça mandar armas mais sofisticadas. Tudo indica que Moscou não pode e não vai tolerar esta escalada, já foram longe demais para recuar. Ou lançam uma ofensiva decisiva, encurralando Zelensky e suas tropas nazistas, ou o imperialismo vai criar novas situações de agressão, como são as novas armas que podem ameaçar o território russo. Mesmo porque eles sentem o cheiro de rupturas e crises no front europeu. Já não podem mais manter a “unidade” sem consequências graves.
Putin no seu discurso por ocasião do 80º. aniversário da vitória das tropas soviéticas contra o nazismo na Batalha de Stalingrado, reforça: “A nossa principal tarefa é garantir a preservação da Rússia, criar as condições para o seu desenvolvimento e fortalecimento. Sem lugar a dúvidas, esta tarefa será cumprida. Mas, uma parte do trabalho para alcançar este objetivo comum é reavivar e manter a memoria histórica.”.. “Esquecer as lições da História leva à repetição de terríveis tragédias. A prova está nos crimes contra civis, na limpeza étnica e nas ações punitivas organizadas por neonazistas na Ucrânia”. Além disso, enviou uma mensagem ao povo europeu, particularmente da Alemanha: “Neste contexto, gostaria de dizer, e na Alemanha eles se lembram disso, que as primeiras vítimas do nazismo foram os antifascistas alemães e é bom que essa memória permaneça entre os cidadãos comuns. Infelizmente, a memória está desaparecendo nas elites de hoje.”
Lula rechaça o envio de armas à Ucrânia proposto pelo alemão Scholz, e propõe um acordo de paz, com a intermediação dos governos da China, Indonésia, Índia, México e Argentina (não fornecedores de armas à Ucrânia), destacando o papel central da China. Proposta dissonante com os europeus e o imperialismo norte-americano. Não é certo que os russos são invasores; eles nunca quiseram esta guerra; foram forçados a intervir para defender suas fronteiras e deter a carnificina nazista dos Batalhões Azov sobre as populações civis. Os deliberadamente desmemoriados apagaram Maidan, apagaram os acordos de Minsk, esconderam os massacres contra a população russo falante. Apagaram da memória coletiva a ofensiva otanista para cercar a Rússia. O imperialismo é o causador desta guerra, mas isso Lula não pode dizer, por diplomacia. Mas pode sim, reforçar as tendências “pacifistas”, como está fazendo, ou seja, dividir mais ainda o front europeu e manter unida a América Latina na neutralidade e não-apoio ao terrorismo nazista ucraniano e europeu
Quais são as relações de forças na América Latina e no Mundo? Avança o mundo multipolar, mas não é qualquer mundo multipolar. O mundo multipolar conduzido em primeiro lugar pelos dois principais países socialistas, China e Rússia, e junto com países que conseguiram se firmar de forma soberana como o Irã, a Venezuela, a Síria, a Índia (que tem arsenal atômico) e Cuba. O mundo multipolar não é o mundo apenas de vários blocos regionais, mas o mundo multipolar global. Há blocos formados regionalmente, mas não se limitam a países vizinhos e fronteiriços. A Rota da Seda abrange centenas de países nos mais variados cantos do mundo.
Passados 7 anos de entendimentos, a China firmou um acordo de 25 anos com o Irã no valor de 1 trilhão e 300 bilhões de dólares. Os acordos entre a China e a Rússia extrapolam a questão econômica para o que chamam de amizade infinita, baseada na emulação socialista, em todos os campos da sociedade. A África recebe investimentos da China como nunca antes visto, na construção de portos, estradas, hospitais, indústrias em troca de fornecimento de matéria prima, possibilitando a retirada de milhares de pessoas da miséria, ao contrário da colonização europeia e norte-americana.
Na etapa do atual é fundamental caracterizar o processo histórico, o nível alcançado pela crise sistêmica do capitalismo mundial, o progresso econômico-social dos países alicerçados em Estados socialistas e as relações de forças que facilitam definir um programa político para mudanças contundentes. Um programa que estabeleça os acordos econômicos estratégicos com os países que permitam defender a própria soberania nacional; acordos de longa duração. Há negócios econômicos pontuais entre os vários países do mundo, mas os maiores acordos estão sendo firmados entre a Rússia, a China, o Irã, a Síria e de certa forma com a Venezuela, e Cuba. Nesse contexto se dá também o processo de integração dos países da CELAC onde o Brasil, com Lula, volta a participar como força central para um processo de descolonização frente ao império norte-americano.
Comitê de Redação
Posadistas Hoje
27/01/2023
Foto destaque:
Putin no 80 aniversário da vitória soviética em Stalingrado
(Prensa Kremlin)