Paulo Roberto Pinto (Jeremias), ao lado das Ligas Camponesas, foi assassinado em Itambé em 1963


Paulo Roberto Pinto, conhecido como Jeremias, nasceu em Itanhandu (Minas Gerais) em 1940 e passou parte de sua infância e da sua juventude em Mogi das Cruzes. Seu pai era militante do PCB e sua família simpatizava com o socialismo. Foi militante sindical na região Leste da Grande São Paulo entre o final dos anos 1950 e o início dos anos 1960, como gráfico e metalúrgico. Tornou-se dirigente do Partido Operário Revolucionário Trotskista – PORT em 1961, quando já adotara o codinome “Jeremias”.

Nesse mesmo ano, participou de grande evento que reuniu, em torno de 1600 delegados de vinte Estados brasileiros, o I Congresso Nacional de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas. Segundo Murilo Leal Pereira Neto (no estudo “Sidney, Olavo e Jeremias” em Desarquivando a Ditadura: Memória e Justiça no Brasil), foi nesse congresso que “os trotskistas estabeleceram contatos com as delegações das Ligas Camponesas, particularmente os cem representantes de Pernambuco”.

Paulo Roberto Pinto acabou por transferir-se para Pernambuco em meados de 1962. Nesse mesmo ano, foi detido por sua atuação junto aos trabalhadores, tendo sido, por algum tempo, um preso político durante o governo de Miguel Arraes.


CIRCUNSTÂNCIAS DA MORTE OU DO DESAPARECIMENTO FORÇADO

Sua prisão foi uma espécie de advertência dada pelos latifundiários. “Jeremias”, porém, não deixou seu trabalho e, à frente de centenas de camponeses, no município de Itambé, região da Mata Norte pernambucana, foi assassinado em 8 de agosto de 1963, aos 22 anos, por pistoleiros a serviço do latifúndio, quando liderava uma greve de trabalhadores rurais da região, em luta por seus direitos.

“Jeremias” havia sido chamado para negociar, em nome dos trabalhadores, o fim da greve de cinco engenhos. O Estatuto do Trabalhador Rural, lei n. 4214 de 2 de março de 1963, era muito recente e previa direitos como salário mínimo, férias, repouso remunerado, contra o que os latifundiários resistiam à força. Ele foi assassinado quando se encaminhava para a sede do engenho Oriente, por capangas de seu proprietário, José Borba.

No ano de 1963, vivia-se uma escalada da violência dos proprietários de terras contra os trabalhadores rurais. Em três de agosto, poucos dias antes do assassinato de “Jeremias”, uma comissão de trabalhadores foi chamada para negociar o pagamento de salário na Usina Santo André e foi alvejada no próprio local pelo gerente e seus capangas, e um dos trabalhadores morreu. Paulo Roberto Pinto foi vítima do mesmo método de “resolução” de questões trabalhistas, a emboscada, adotado pelo latifúndio.

Segundo o historiador José Felipe Rangel Gallindo, em Jeremias: o trotskismo no campo em Pernambuco, “[…] a articulação do proprietário do engenho Oriente, José Borba, em armar seus empregados, que andavam ostensivamente armados, contratar pistoleiros que o acompanhavam, foi a forma violenta com que quis responder ao processo de conscientização e organização dos seus trabalhadores rurais liderados por Jeremias”.

Foi inédito, em Pernambuco, que a violência contra os trabalhadores rurais gerasse um inquérito policial contra os fazendeiros; foi o primeiro inquérito em que um latifundiário foi chamado a depor. O laudo necroscópico atestou que “Jeremias” foi atingido pelas costas. O promotor, Murilo Barbosa, havia sido advogado das Ligas Camponesas, o que gerou críticas da imprensa local.

O governo de Miguel Arraes providenciou o traslado do corpo para o Rio de Janeiro, de onde a família o levou para ser enterrado em Mogi das Cruzes. Segundo o depoimento de Felipe Gallindo dado em audiência pública organizada pela CEV ‘Rubens Paiva” em maio de 2014, tratava-se da “política muito agressiva de esquecimento” para que não fosse criado um “espaço de memória em Itambé, onde os camponeses já visitavam o túmulo de Jeremias, já acendiam velas, já começavam a rezar”.

No dia 12 de agosto, foi realizado, na praça principal de Itambé, um ato em homenagem a sua memória, com a participação do então deputado federal Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, o que fez os latifundiários da região pedirem repressão ao governo do Estado.

José Borba possuía laços familiares com os donos do poder: o vice-governador, Paulo Guerra, era casado com Virgínia Borba, sobrinha do proprietário do Engenho Oriente. Com o golpe de 1964, o governador Miguel Arraes foi afastado pela ditadura militar. O juiz encarregado do caso, Edgar Moreira, foi preso sem jamais receber acusação formal; o promotor, Murilo Barbosa, e o tenente da Polícia Militar, Francisco Santana Nunes, responsáveis pelo inquérito, foram processados e perderam seus cargos em represália à investigação da morte de “Jeremais”.

(Extrato da Comissão da Verdade de São Paulo – Rubens Paiva)

Leia mais na Comissão da Verdade (SP):

http://comissaodaverdade.al.sp.gov.br/mortos-desaparecidos/paulo-roberto-pinto

Leitura sugerida, de obra de Felipe Gallindo:

https://periodicos.ufpe.br/revistas/cadernosdehistoriaufpe/article/viewFile/109956/21903

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