A revolução venezuelana se prepara para mais uma prova decisiva, com as eleições deste dia 20 de maio. Jamais uma revolução social enfrentou tantas eleições, em condições extremas de guerra econômica e ameaças do imperialismo, conspiração interna e sabotagens, e as suas próprias dificuldades, e mesmo assim teve continuidade com base no voto popular. Mesmo tendo perdido a forte liderança de Hugo Chávez, este havia construído fortes bases institucionais e sociais para que a transformação tivesse continuidade mesmo na hipótese extrema de sua ausência.
É o que se pode observar na resistência às sucessivas tentativas de desestabilização, e tendo às portas um imperialismo que ruge para lançar guerras em meio mundo, que bombardeia a Síria e agora ameaça diretamente o Irã. Os dirigentes chavistas, o PSUV, os revolucionários venezuelanos, conseguiram conter momentos críticos, as manifestações violentas, as várias conspirações, e responderam com o chamado à intervenção popular, o voto, conseguiram construir um processo de Assembleia Constituinte para contrabalançar a única derrota significativa da revolução em todos estes anos, que foi a constituição de uma maioria reacionária na Assembleia Nacional, o Congresso venezuelano, que serviu de plataforma para todo tipo de ataque das elites e da extrema direita.
Isso não teria sido possível sem a existência de um marco institucional conquistado na Constituição Venezuelana que prevê estes instrumentos amplamente democráticos para organizar a participação popular, a organização armada do povo ao lado das Forças Armadas convencionais, altamente politizadas e envolvidas em programas sociais, que prevê a formação de conselhos populares paralelos às administrações locais tradicionais, os sistemas de comunicação popular ampla, difusa e livre, uma rede estatal de comunicação poderosa, o controle estratégico inegociável do petróleo e dos recursos fundamentais do país pelo Estado, e naturalmente, as alianças internacionais com os Brics e os países da linha de frente da luta contra o imperialismo. Tudo isso com altíssimos investimentos educacionais e sociais que superaram definitivamente todos os índices das “metas do milênio” e outros mais da ONU, Unesco, OMS, colocando a Venezuela num alto patamar de desenvolvimento social, que só não é maior pela sabotagem e pela estrutura industrial incipiente, propositalmente mantida no passado pela elite rentista e petroleira, que agora está sendo superada com fortes investimentos estatais. Essa é a base do consenso popular, nada parecido com uma “ditadura” como reza a cartilha de Whashington. 18 eleições em 20 anos, com uma única derrota para o chavismo, esse é o balanço. Esta não será diferente, a julgar pelos prognósticos.
Quais lições traz a Venezuela para o processo no Brasil? Aqui as derrotas têm sido de dimensões catastróficas, se consideramos o alto patamar de conquistas nos governos de Lula e Dilma, que pareciam inexpugnáveis. Junto com a Venezuela, o Brasil, em menos de duas décadas, havia dado um salto em conquistas sociais e em termos de soberania nacional, de dimensão secular.
Porque então bastou a formação de uma nova maioria parlamentar, com a debandada dos aliados do campo burguês que até então sustentavam – em muitos casos a contragosto – o governo progressista, para derrubar Dilma, à revelia da lei e da Constituição, e abortar violentamente todo o processo de conquistas que pareciam irreversíveis?
Na verdade não se tratou somente de uma nova maioria parlamentar, senão de um longo processo conspirativo e minuciosamente preparado entre as forças mais reacionárias e retrógradas do país, da elite financeira, empresarial e agrária, em completa sintonia com o imperialismo norte-americano, que não toleravam o empoderamento das massas populares e sua ascensão social, cultural, econômica. Foram se dando as condições para a guerra assimétrica, a guerra não-convencional da qual o Brasil é vítima, pela fragilidade da democracia brasileira e pela crença generalizada na esquerda de que o jogo ganha-ganha que caracterizou os governos do PT pudesse se eternizar, se que isso fosse se chocar, em determinado momento, com os interesses do imperialismo e das elites mais reacionárias. Eis aí, como estes interesses, continuam vivos na guerra mundial atual, na repressão aos palestinos onde a sanha fascista dos EUA, provoca a contínua situação de conflito, enviando seus cães de guarda sionistas de Israel.
A esquerda não se preparou para esta guerra de classes, e ainda mais de caráter internacional. Criticava o modelo “chavista” por considerá-lo radical, antidemocrático. Se burlavam do arrojo e do ímpeto de Hugo Chávez, e propugnavam por um gradualismo que seria mais “eficaz” que bater de frente com as elites. Esticaram ao máximo o jogo de conveniências e de alianças, buscaram a complacência da mídia – sem reduzir o seu poder, ao contrário, alimentando-a; não tocaram nos interesses do setor financeiro, ao contrário, o fortaleceram; e de quebra, criaram um monstro, empoderando o setor judiciário, já por si aristocrático e indiferente para com os mais pobres. Foi aí que o imperialismo encontrou o flanco aberto, e por meio de um punhado de juízes e procuradores corruptos e reacionários, e da própria Polícia Federal ideologicamente educada e treinada tradicionalmente pelo Império, conseguiu montar a arquitetura da “Lava Jato” e do combate à “corrupção”, como pretexto para aniquilar a esquerda.
Junto ao poder monopolístico e uníssimo da mídia privada, com controle total sobre o território nacional e sem qualquer controle, deram-se as condições para a nova “revolução colorida” de novo tipo, com as massas manipuladas na rua e o time dos “procuradores-heróis” demolindo as classes políticas tradicionais, com viés anti-esquerdista declarado, e demolindo setores do empresariado nacional que ousaram comprometer-se com um processo de soberania nacional já muito avançado. Daí ao novo fascismo e à ditadura, um só passo. E chegamos à aberração da condenação e prisão de Lula por um objeto inexistente.
A lição a se aprender da Venezuela é que esta dotou-se de instrumentos institucionais de participação popular e defesa civil contra este tipo de situação, a começar pelas Forças Armadas, de onde nasceu o chavismo: a união cívico-militar está na gênese da revolução venezuelana. E é um fenômeno possível, embora desprezado no Brasil, em que se fomenta um ranço antimilitar, confundindo-o com o ódio à ditadura que vivemos. Num momento em que Lula está preso, em que a ditadura é exercida pelo judiciário e por parte da classe política mais corrupta, em representação do empresariado mais tenebroso, levantar o tema dos militares como torturadores cruéis é fazer o jogo da direita, que quer recompactá-los, uni-los no espírito de caserna, para impedi-los de debater, junto à sociedade civil, aos movimentos populares, as graves violações da soberania nacional hoje, aqui e agora, como a já em curso demolição da Petrobrás e a iminente venda a preço de banana da Eletrobrás.
Querem que a esquerda se apresente em todo caso e situação, hostil às Forças Armadas.
Não é a realidade, nem foi assim nos governos Lula e Dilma, que reconquistaram a confiança e os corações de muitos setores militares, com atos concretos relacionados com a soberania e o fortalecimento das Forças Armadas, em contraposição com o sucateamento e desmanche da era FHC. Não se considera que há uma outra geração militar, os jovens oficiais de hoje não têm as mãos sujas de alguns dos velhos generais e oficiais, muitos deles já mortos.
O julgamento e a punição dos crimes da ditadura e seus responsáveis um dia deverá ser feito, mas isso implica numa reconstrução ideológica e funcional de todas as forças repressivas do Estado, inclusive as forças policiais e militares, que atuam como capitães-do-mato até os nossos dias. Somente um governo popular que tenha a força para colocar a mão neste vespeiro pode encarar esta tarefa, não uma esquerda encurralada e derrotada, ameaçada até mesmo de extinção. É hora de colocar a cabeça no lugar: é preciso trazer as Forças Armadas para o nosso lado, tirá-las do lodo de quererem transformá-las em capitães-do-mato nas favelas, convocá-las para defenderem a Soberania Nacional e as conquistas sociais da maioria da população. O inimigo não está às portas, já está dentro do país e das instituições, promovendo a demolição da Nação Brasileira. Esse é o chamado que se deve fazer, em contraposição da “intervenção militar” bolsonarista, canalha e covarde, tentando empurrar os militares para que sujem as suas mãos com o sangue do povo.
É hora de dificuldade, de resistência, e de valorizar todo gesto de heroísmo como toda a enorme mobilização por Lula. É hora de unidade sim, mas não somente eleitoral, e sim de compreender que existe somente um líder capaz de mobilizar milhões de pessoas neste país no momento, e este homem é Lula, nenhum outro. Há bons candidatos, há bons líderes, há excelentes iniciativas como a Frente Pelo Petróleo do Brasil liderada por Requião, mas a situação atual somente poderá ser revertida com a intervenção de milhões, nas ruas, nas urnas, nas cidades, nos acampamentos, onde for. E estes milhões só se mobilizarão com o chamado de Lula, por Lula e com Lula.
Não temos as milícias populares, não temos as Forças Armadas vinculadas institucionalmente e politicamente à defesa intransigente da soberania nacional tão arrasada no momento, não temos as Assembleias Populares com poder deliberativo como na Venezuela, não temos nenhuma mídia relevante para além das redes sociais que chegam a no máximo 30% da população, frente a uma guerra de desinformação e desconstrução da imagem dos líderes populares mantida 24 horas por dia. Novas lições a se aprenderem da Venezuela, que não teria resistido aos ataques do Império se não fossem estes instrumentos, sapientemente criados por Hugo Chávez. A estatização da fábrica da Kellogs pelo governo de Nicolás Maduro na Venezuela, frente ao fechamento arbitrário feito pela patronal opositora para sabotar as eleições, é um exemplo de força e decisão revolucionária, que transcenderá os limites da muito provável vitória eleitoral: controle operário da economia e da produção, fábrica parada, fábrica estatizada, nas mãos dos trabalhadores!
É hora de se compreender porque as elites mundiais alimentavam um ódio visceral contra Chávez, como mantiveram por décadas contra Fidel. E Lula, tão “paz e amor”, que era “o cara”, porque agora é demonizado? Simplesmente porque ousou enfrentar o Império e colocar o Brasil no rol das Nações mais importantes do mundo. Mas ele não se preparou para essa guerra, que viria inexoravelmente, como acontece com todas as Nações poderosas.
Aprender as lições da Venezuela, centrar fogo na libertação e eleição de Lula, preparar-se para o enfrentamento, trazer as Forças Armadas para o nosso lado contra os atentados à soberania nacional, manter e fortalecer a unidade e a mobilização de todas as forças populares e nacionalistas é a prioridade absoluta.
Comitê de Redação
Jornal Revolução Socialista
8 de maio de 2018