Os países da América Latina estão sob a influência deste processo mundial de decomposição econômico-social do capitalismo que não encontra outra saída senão a concentração financeira, a indústria bélica e a guerra. O agravamento da inevitável dualidade de poderes entre o grande capital financeiro do imperialismo norte-americano, e o bloco estatal socialista da China-Rússia e os países do bloco asiático do BRICS, exige políticas decisivas a favor dos povos ou dos super-poderes concentrados do capital. A fragilidade política dos governos de esquerda ou progressistas de se firmarem para um processo de desenvolvimento de mais longo prazo, se acentua em meio à investida golpista do lawfare. Breves períodos de avanços econômico-sociais de governos progressistas, são encurralados pela reinvestida de governos neoliberais prontos para aplicar o Consenso de Washington.
Após o impeachment contra Dilma e a prisão de Lula, veio o golpe contra Evo Moráles na Bolívia, e agora, no Peru está em pleno desenvolvimento um golpe contra o presidente Pedro Castillo. Houve a tentativa de magnicídio da vice-presidenta Cristina Kirchner, seguido de uma forte desestabilização do governo de Alberto Fernandez na Argentina, e o recente atentado à vice-presidenta Francia Marquez na Colômbia; sem contar, as tentativas golpistas a partir de 8 de janeiro contra Lula. A chefa do Comando Sul dos EUA, Laura Richardson, revela descaradamente como a intervenção norte-americana está traçada sobre os recursos naturais e terras raras (petróleo, ouro, lítio e água) da Argentina, Peru, Bolívia, Chile, Brasil, Venezuela e Nicarágua; e que os inimigos dos EUA são claramente, Cuba, Venezuela, Nicarágua e Rússia. O Plano Condor segue vigente.
A Bolívia a custo de sangue conseguiu reverter o golpe contra Evo Morales. A Venezuela depois de anos de sabotagem da direita das mais variadas formas, se estabiliza através das comunas, do exército nacionalista-revolucionário e da organização popular armada para defender a Revolução Bolivariana, junto a avanços na economia de um Estado revolucionário combatido sem fim; recentemente, se tornou autossuficiente na produção de milho, alimento básico aos venezuelanos. Cuba com todos os bloqueios econômicos segue firme nos acordos com a China, Rússia, Irã e outros países. A Argentina, se encontra num impasse onde o governo peronista da Frente de Todos ainda não conseguiu reverter o poder real das forças neoliberais, cúmplices da ditadura dos anos 70, encrustado na Corte Suprema de Justiça, em conluio com a mídia hegemônica.
O tema do Peru tem sido ignorado por parte da esquerda brasileira, e merece muita atenção, pois é parte do contexto regional que incide na desestabilização do apenas nascido governo do Lula e do PT. Absurdo, não enxergar nada no governo de Castillo; não ter visto o que estava por trás: o lawfare, com conivência da maioria congressual opositora e golpista, que o impedia governar; enfocaram as suas limitações, mas não o movimento social que o elegeu e que apesar de tudo o apoiava. E agora ignoram o que acontece lá, apesar do esforço heroico das massas de se manterem mobilizadas, com mais de 60 mortos e uma repressão que não cessa. E ignoram que essas massas reconhecem Castillo como presidente, apesar de tudo, e exigem a sua volta. Se Castillo volta, arrancado da prisão pelo povo, vai ser à esquerda, vai ser um Chávez, pois vai ter apoio popular, devendo despertar o nacionalismo militar de épocas de Velasco Alvarado. Esse é o terror das elites peruanas. Mas a esquerda brasileira viu nele um “golpista”, quando era evidente que o golpe era das elites, do parlamento e da vice-presidente, todos orquestrados pelo imperialismo. Mas se deram mal, o Peru pode mudar, e a vitória de Lula foi um impulso para a luta do povo humilde peruano.
Lula, a Frente Ampla e os movimentos sociais conseguiram um feito inédito, derrotar eleitoralmente um governo fascista e neoliberal, partindo de um patamar político elevadíssimo, mas em plena consciência de que enfrentará, como está enfrentando, a direita fascista, atuante como foi no quebra-quebra na titularização do Lula à Presidência da Republica, e a desesperada tentativa de golpe em 8 de janeiro e os ataques terroristas contra as torres de energia.
No governo Lula, será preciso fortalecer os laços econômico-políticos entre os países da América Latina, partindo da correlação de forças mundiais que está demonstrando vontade política para enfrentar o imperialismo anglo-americano em decadência. Os EUA tentam manter seu domínio nas suas antigas colônias, através de golpes, financiamento de fascistas, promovendo revoluções coloridas. Infiltram-se através da CIA nos aparatos governamentais e até mesmo nas Forças Armadas.
O governo Lula estará em eterna disputa. A Frente Ampla que foi importantíssima para derrotar o fascismo e a direita, com o tempo, manifestará suas contradições. Apesar da vitória do Lula, o agronegócio não deixará de envenenar a agricultura, as pessoas, os alimentos, o meio ambiente e os lençóis freáticos. O governo enfrentará um Congresso Nacional com predominância de bancadas específicas com interesses próprios; encontrará uma enorme dívida com os banqueiros e um Banco Central, nestes primeiros dois anos, nas mãos dos mesmos; enfrentará setores privatizados que deveriam estar sob o controle do Estado dentro de um projeto sólido de desenvolvimento.
A política neoliberal pelas mãos do nazi-fascismo de Bolsonaro, não convinha mais à Globo e à maioria do STF; estes optaram por competir em democracia, apoiaram a eleição do Lula, sendo que no passado jogaram contra o PT, apoiaram o golpe contra a Dilma, atuaram pela prisão do Lula com a Lava Janto, jogando contra os movimentos sociais. É preciso ter isto em conta, para não ficarmos subordinados aos objetivos destes setores, ao mesmo tempo em que há que apoiar as fortes decisões do juiz Alexandre de Morais. A Globo e o STF viram que o monstro que eles criaram, cresceu e se voltou contra os seus criadores. Levando a sociedade a barbárie. A criatura ficou maior que o criador. Há a questão militar. As Forças Armadas há muito têm navegado na ideologia neoliberal e de certa forma antidemocrática. Não participaram diretamente de um golpe em 8 de janeiro porque não havia um ambiente para tal, mas se tivessem a oportunidade, teriam participado de um golpe militar. Por isso, é justificável a pressão da esquerda ao Ministro da Defesa para a rendição de contas de todas suas ações.
Com a autoridade do Lula a nível internacional, e a correlação de forças mundial de crise das burguesias nos EUA e na Europa pode jogar a favor das alianças políticas e o empurrão inicial das medidas do projeto eleitoral de reconquista da soberania. Neste contexto é muito importante o papel de relevo do Brasil de Lula na recuperação do funcionamento progressista de integração regional da América do Sul e do Caribe através dos acordos na recente CELAC na Argentina, onde um dos temas foi a moeda comum (contra o domínio do dólar) entre o Brasil-Argentina extensiva ao resto da região. Mas, nunca esquecer a importância dos movimentos sociais para consolidar um governo Lula que consiga estabilizar a democracia brasileira na verdadeira acepção da palavra: democracia para as massas recuperarem a sua dignidade econômica, humana e social.
Comitê de Redação
Posadistas Hoje
28 de janeiro de 2023