A guerra da OTAN na Ucrânia e a política exterior brasileira


Neste contexto de guerra, há muitas expressões ou tendências da burguesia europeia à nazificação, como dito por Putin no discurso na Assembleia Federal da Russa. Tem exatamente o mesmo comportamento que teve frente à ascensão de Hitler: deixe crescer o nazifascismo para combater a Urss e o comunismo. Mesmo tendo sucumbido frente à truculência alemã, a França, a Bélgica, a própria Inglaterra – que só não foi invadida por pouco –, após terem apoiado Hitler em sua “empreitada” da invasão da Urss – as burguesias europeias nunca assimilaram a lição, e por isso imediatamente após à guerra, vencida pela Urss e pelos comunistas dos vários países, a resistência partisana, imediatamente constituíram a Otan e começaram a “guerra fria”.

Hoje, o “combate ao comunismo” é mais difuso, não tem foco, porque a Rússia não tem uma direção revolucionária declaradamente socialista, comunista. Apesar de que, o imperialismo é ciente de que a antiga e robusta estrutura do Estado operário é a que sustenta a resistência da Rússia e inspira os seus líderes e outros da Comunidade de Estados Independentes. Se juntamos isso com a ascensão da China, e sua aliança férrea com a Rússia, a analogia com a época do Nazifascismo x Urss não é tão longínqua.

Vejamos o comportamento dos socialistas e socialdemocratas: tal como na primeira guerra, eles sucumbem frente às burguesias nacionais. Isso explica o abraço entusiasta dos “socialistas” europeus, tipo Pedro Sánchez a Zelensky, mas não só ele, como dizem os relatos de sindicatos, partidos de esquerda, movimentos pacifistas, todos eles escudados no conceito de “democracia” ocidental para acusar a Rússia de agressora, alentando a russofobia, fechando os olhos para as atrocidades cometidas contra a população russa e a ruptura de todos os acordos assinados com a Rússia para a contenção da Otan e desmilitarização da Ucrânia. Então este pacifismo egoísta e hipócrita – que reflete o descontentamento com os aumentos dos preços dos combustíveis, aquecimento, inflação, e perda de direitos trabalhistas – nem de longe arranha a determinação da UE e da Otan de continuar a alimentar o monstro do fascismo bem à vista na Ucrânia.

Chama a atenção também como a versão “ocidental” bate de frente com a realidade, as evidências de que a guerra foi provocada deliberadamente pelos EUA-OTAN que não têm a menor intenção de atenuá-la ou contê-la. Somente a postura firme da Rússia e sua decisão declarada de chegar às últimas consequências – leia-se guerra atômica – contém uma escalada ainda maior na “Cruzada” ocidental, que seria o fornecimento de aviões mais modernos, mísseis de longo alcance e outras medidas que a Rússia considera a “linha vermelha” que não deve ser ultrapassada.

Há uma explicação então para a postura suicida das elites europeias, e da Alemanha em primeiro lugar: sacrificar o seu povo no altar da guerra, para atender aos interesses dos EUA e servir de aríete contra a poderosa Rússia: é o instinto de classe em última instância, pois pressentem que por trás da atitude firme da Rússia, esteja o renascer do comunismo, hoje chamado eufemisticamente de “mundo multipolar”, que é a forma que toma hoje. Porque onde o mundo se tornou “multipolar”, ou seja, libertou-se das garras do imperialismo mundial, segue-se o caminho das estatizações, do planejamento econômico, da soberania nacional, do desenvolvimento econômico com direitos sociais. Exemplo disso, a China, a Rússia, Vietnã, Cuba e Venezuela.

A ação da Rússia na Ucrânia, acompanhada do discurso de Putin na Assembleia Federal da Rússia, demarca historicamente uma posição de enfrentamento com o imperialismo. Acabou-se uma certa “paz”. Mesmo porque a China e a Rússia acumularam musculatura para enfrentar os EUA. Putin está alertando o mundo da loucura do imperialismo, dos EUA e setores concentrados da Europa. Fez um resgate histórico das atrocidades dos EUA, das centenas de base militares dos EUA espalhadas pelo mundo.

O problema dessa postura quase unânime da burguesia europeia – submetida à pressão dos EUA, Canadá, Japão, e outros países ricos – é que impõe uma ditadura ideológica mundial, russófoba e mentirosa, escondendo e negando o óbvio, que é a própria nazificação. Jamais se viu tanta repressão midiática aos meios alternativos, às opiniões divergentes, à informação “do outro lado”, ou simplesmente à informação verdadeira, criando um gigantesco tapa-olhos para as massas no mundo na era da globalização midiática. Caem por terra os mitos das “redes sociais” como espaços de liberdade, e estas se tornam armas de guerra contra a Rússia, o Irã, a China, a Venezuela, apesar dos focos de resistência e resiliência.

Incidência da guerra na política exterior do Brasil

Todo esse contexto explica em parte o posicionamento do governo Lula na votação da resolução da ONU. É preciso lembrar que o PT contém correntes que acompanham os mesmos temores das elites europeias e ainda as têm como referência de “democracia”. Embora seja compreensível do ponto de vista tático e diplomático, a crueldade dos fatos em andamento coloca em xeque as posições ambíguas ou negociadoras, ou mesmo pacifistas. O pragmatismo de Lula em si não seria um problema, já que a frente interna neste momento é prioridade, afinal o Brasil esteve – e ainda está – à beira do abismo depois de 2 anos de Temer e 4 de bolsonarismo.

A guerra é uma necessidade do imperialismo, e foi criada para criar uma situação de enfraquecer a Rússia, depor o Putin e tentar esquartejar o território Russo rico em recursos minerais. E repartir as riquezas entre as oligarquias europeias que apoiam ameaçar a Rússia com armas atômicas. Conseguiram separar os territórios com o fim da URSS, mas não esperavam que após este desastre, a Rússia ressurgiria com força total para defender sua soberania e enfrentar o imperialismo. E muito menos a extraordinária unidade Rússia e China.

Há que analisar a débil posição do Brasil com o voto na ONU. Evidentemente, o governo Lula está sofrendo pressão de todos os lados. Ao mesmo tempo que se recusa a enviar munição para os tanques ucranianos, e agora, é sancionado pelos alemães com o veto à venda de tanques para o exterior. A permissão à chegada e estacionamento dos navios iranianos em portos brasileiros, é outra demonstração de política exterior soberana. Em contrapartida, o voto desfavorável à Rússia na ONU, com aparente tática diplomática, expressa debilidade, e tem ação-reação de forças internas no campo das alianças de governo no Brasil, mais que no campo mundial e da guerra em si. A China tem maior poder de decisão que o Brasil seja para a guerra ou para a paz.  A China, aliada da Rússia, tem maior poder de barganha sobre parte das burguesias europeias para impor recuos, diante das vantagens do Cinturão e Rota da seda chinesa. A importância econômica do Brasil exportador/importador existe, mas a China é decisiva econômica e politicamente.

A posição débil do Brasil em relação a Rússia, serve ao imperialismo, Biden, ao submetimento da economia brasileira aos EUA, às decisões de mercado do novo Ministro das Minas e Energias contra a escolha de economistas anti-grupos financeiros concentrados, como Eduardo Moreira, no Conselho de Administração da Petrobrás. Há que estar atento aos “aliados” que com esse voto na ONU põe fogo na fogueira de um possível afastamento do Brasil aos BRICS. Interessa ao imperialismo desestruturar os BRICS. Típico de guerra hibrida.

A questão é a agudez dos fatos advindos do enfrentamento global, que caminha para um “ajuste final de contas” entre potências nucleares, não dão muito campo para a diplomacia e para o pragmatismo, que terminam por ser inócuos quando arde o campo de batalha. Portanto, não se trata de condenar ou apoiar a posição do Brasil na ONU e preocupar-se muito com a ruptura com a política de altivez e soberania mantida nos governos Lula com Celso Amorim, isso não vai mudar nos fatos mais relevantes. São vacilações, erros de avaliação, como não qualificar o regime do Peru como ditadura e o novo governo como golpista. O fundamental é na disputa interna, impulsionar as decisões econômicas e políticas soberanas com mobilização popular, sindicatos, legisladores combativos no Congresso.

É preciso acompanhar esta nova diplomacia, ver seus limites, e fazer a crítica justa, mas considerar o essencial: o Brasil como eixo condutor da reconstrução da CELAC, da UNASUL, como membro dos BRICS, e como nação capaz de manter laços e relações com todos os países do mundo, em particular com a China. Esses são os eixos, e não os deslizes diplomáticos. O fato é que, na realidade atual, não há espaço para países “fracos”, o mundo ocidental opulento – leia-se a plutocracia financeira internacional – está em guerra contra a Rússia e demais países da CEI, contra a China, a Venezuela, o Irã, e vai fazer a guerra contra todos os que se alinhem de uma maneira ou outra com o “outro mundo”. A palavra de ordem é: muito sangue frio, não perder o rumo estabelecido de defender o mundo do trabalho, a soberania, o ambiente, as conquistas sociais, quaisquer que sejam os desdobramentos internacionais. E sobre esta base, escolher o lado com o qual se alinhar. As burguesias europeias fizeram a sua escolha: cabe ao Brasil com o governo Lula, fazer a sua.

Comitê de Redação

PosadistasHoje

27/02/2023

Votação na ONU (Foto: AFP)

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